Texto: Joana Ribeiro
Fotos: Daniel Sampaio
Ao início da tarde, havia quem ainda se estivesse a instalar, pelo que o SWR Arena, palco mais pequeno, estava pouco concorrido. Os aquecimentos, com as bandas brasileiras Aneurose e Chaos Synopsis – ambas de thrash, a primeira com laivos de groove e a segunda a puxar um pouco mais ao death metal – começaram com alguma demora devido a problemas no som, mas nem por isso com menos energia e boa disposição.
Seguiram-se os alemães Valborg, com o seu som pesado e complexo. Mesclando influências de géneros como o doom, gothic, death e black metal, tiveram das aparições mais interessantes e cativantes deste primeiro dia.
Tal como o festival, também os Holocausto Canibal comemoravam 20 anos de existência. Cobertos de “sangue”, cabeças de porco em palco, o costumeiro brandir de motosserra – a parafernália toda – foram percorrendo êxitos da carreira como “Objectofilia Platónica”, “Prepúcio Obliterado” ou “Trucidada na Paragem”, não esquecendo as composições dos seus primórdios, recuperadas no novo álbum acabado de sair. A celebração de duas décadas de gore & gajas não podia ter sido mais memorável.
O início da actuação de Besta compôs-se de temas mais recentes, mas depressa surgiram os (ainda mais) rápidos, sujos e caóticos temas de “Ajoelha-te Perante a Besta” e “Herege”, que têm sempre o efeito de uma injecção de adrenalina em quem assiste. Tudo cuspido com a mesma raiva pelo alucinado vocalista, num concerto com a energia e brutalidade a que já nos habituaram.
Em simultâneo decorreram os concertos de Pillorian e La Hija del Carroñero. Revelou-se acertada esta sobreposição, já que os públicos eram bastante diferentes, e isto evitou esperas desnecessárias para ver a banda que realmente se queria. No palco mais pequeno, os espanhóis faziam as delícias dos amantes de death/grind; já no palco principal, Pillorian não conseguiu prender grandes atenções. A melancolia já seria expectável tendo em conta o seu som, mas parece que algo falhou em envolver-nos, ficando apenas a ideia vaga de um concerto mortiço.
Marginal também ficou a dever um pouco à intensidade. Até o público parecia um pouco desinteressado – talvez pela expectativa em ver Aborted, que se seguiam – e acabamos por ficar com aquela sensação de concerto que se estende um pouco mais para além do que seria desejável. Os headliners Aborted eram seguramente o nome mais aguardado do dia: a multidão amotinava-se junto ao palco principal, evidenciando a excitação contida ao longo de um ano – já que a banda foi cancelada na edição anterior do festival. Goste-se ou não do seu género, por vezes difícil de digerir por misturar o que de mais brutal e o de mais técnico o death tem, a verdade é que foi uma performance absolutamente demolidora que não terá deixado ninguém indiferente.
The Ruins of Beverast foi uma desilusão: para além do som ser tão difuso que era quase impossível distinguir fosse o que fosse das músicas, o intenso nevoeiro não permitia ver quase nada, criando assim uma distância incontornável entre o público e a banda. Inquisition serviu para levantar um pouco o ânimo, com um dos melhores concertos do dia – e mesmo do festival. O lançamento de “Bloodshed Across The Empyrean Altar Beyond The Celestial Zenith”, que muitos têm como o melhor álbum da banda, colocou as expectativas bastante altas para a sua actuação, e estas foram satisfeitas, senão superadas. Ao contrário do concerto anterior, aqui o som estava muito claro, sendo possível desfrutar das passagens mais melódicas que os caracterizam e que, em conjunto com os vocais muito particulares de Dagon, nos induzem numa espécie de transe.
Para nos sacudir deste estado transcendental tivemos o thrash old school dos Antichrist, rápido e furioso como é suposto o thrash ser. Foi um bom aquecimento para Master – e lá mestres do death/thrash são eles. Foram revisitados “Master”, “Slaves to Society”, “The Human Machine”, com o público reduzido a uma massa de corpos em agitação que leva tudo pela frente – é inevitável, o seu som torna imperativo mexermo-nos. E assim nasceu um dos pits mais respeitáveis que esta edição do Barroselas viu. Quando chegamos ao fim de um concerto a pensar que estes teriam sido os justos cabeças de cartaz, está tudo dito sobre a qualidade do mesmo.
Este último concerto fez bem mais do que encher-nos as medidas, mas ainda restavam dois, fruto da parceria com a Signal Rex. The Ominous Circle conseguiu a maior enchente do palco pequeno neste primeiro dia. Das mais refrescantes figuras do death metal nos últimos tempos, criam uma atmosfera sombria e pesada que quase torna difícil respirar, entrecortada pelos ocasionais rasgos de brutalidade que nos deixam sem saber onde meter. A dinâmica deste misterioso colectivo cativa transversalmente a géneros e gostos pessoais, como se pôde ver pela reacção geral do público. Ingrata foi a posição de Enlighten, que deram neste final de noite o seu primeiro concerto, mas que receberam pouco ou nenhuma atenção: a maioria do público tinha já dispersado e, após um concerto tão avassalador com foi o de The Ominous Circle, tudo o que viesse a seguir soaria demasiado brando. Percebe-se a decisão de manter a “surpresa” para o final, de modo a obrigar o público a manter-se por ali, mas ficou demonstrado que a táctica nem sempre funciona. Embora ensombrados por esta posição no cartaz, Enlighten revelaram competência no seu primeiro concerto e são definitivamente uma banda a manter debaixo de olho.