Texto: Gustavo Silva
Fotos: Daniel Sampaio
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A honra de abertura da noite coube aos Engaging the Dead. Neste grupo proveniente de Matosinhos, praticantes de um deathcore com influência de technical death, duas coisas se evidenciam logo nos primeiros minutos da actuação: primeiro, um enorme à vontade em palco, com uma postura bastante relaxada. Em segundo lugar, salta à vista uma capacidade técnica individual e uma coesão intra-banda muito acima da média. Apesar do estilo algo “sobreexplorado” nos dias de hoje, praticam uma variante que não se deixa ir pela típica estrutura verso-refrão-verso-breakdown, acrescentando variabilidade com secções limpas, quer em termos de guitarra quer em termos de voz. A fasquia foi colocada bem alta logo desde o início, e a prova disso era a enorme receptividade do público.
De seguida, coube aos Trepid Elucidation a tarefa de manter o nível energético em cima num Metalpoint cada vez melhor composto. Este quarteto, formado em 2012, proveniente de Lisboa, é formado por Francisco Marques na baterista, João Jacinto na guitarra, Renato Laia no baixo e Diogo Santana a tomar simultaneamente conta da voz e da segunda guitarra. Após uma curta intro, começa o que viria a ser um autêntico festival de porrada sonora. Um technical death metal com influências tecnicistas de uns Necrophagist, um groove clássico à moda dos míticos Death e a brutalidade de uns Decrepit Birth resultando num casamento perfeito entre técnica, melodia e groove. Excelente prestação deste colectivo, com uma solidez em palco invejável e que foi, para quem já não os conhece, uma das grandes surpresas da noite. “Não tocamos death metal da escolinha”, referiu Diogo Santana antes de apresentar ao público o excelente single “Diminished Into a Spacetime Interval”. Não podíamos estar mais de acordo com as palavras do frontman. Tendo em conta o material apresentado (incluindo uma música nunca antes tocada ao vivo), ficamos a salivar por um hipotético álbum.
Se podemos dizer que as duas bandas anteriores foram os rolos compressores que deram uma lição de peso a todos os presentes, encontramos em Moonshade a (esquizofrénica) calma pós-tempestade. Com seis homens em palco, assistimos a uma prestação extremamente sólida deste projecto de melodeath, carregada de feeling e um grande à vontade em palco da parte de todos os elementos, com a simpatia do vocalista Ricardo Pereira a cultivar uma excelente relação com o público. Nem os problemas técnicos impediram a banda de providenciar um óptimo concerto, pois foram resolvidos de forma célere e mitigados pela atitude bastante descontraída do frontman. Resolvidos os problemas técnicos, mais uma vez assistimos a uma execução musical brilhante, evidenciando um forte entrosamento entre todos, com uma setlist construída à volta do EP de 2014 “Dream | Oblivion”. À voz poderosíssima de Ricardo Pereira contrabalançava a voz harmoniosa de Pedro Quelhas, encarregue da guitarra lead e dos vocais limpos; aos leads furiosos contrabalançavam as melancólicas passagens de guitarra limpa, com orquestrações de backing, que normalmente antecediam secções de fúria primitiva, não ficando em nada a dever a uns Insomnium, Dark Tranquillity ou Swallow the Sun. Nota também para o baixista Afonso Aguiar que acabou por tocar dois concertos seguidos, já que mais tarde acabaria também por assumir as mesmas funções com os Dark Oath. Um belo concerto que estabeleceu de forma perfeita um elo de ligação entre a fúria dos concertos anteriores e a epicidade do que estaria para vir.
Finalmente, por volta das 2 da manhã, eis que os Dark Oath sobem ao palco para nos apresentarem o seu novíssimo “When Fire Engulfs the Earth”, editado a 15 de Abril pela Wormhole Death Records. Primeiro longa duração da banda de Soure, liderada pela carismática Sara Leitão, marca o regresso aos palcos, dois anos depois. Após uma gloriosa intro sinfónica, a banda brinda os presentes com a primeira faixa do álbum, “Land of Ours”, e rapidamente conquistam a plateia com a energia vibrante de todos os elementos da banda, um trabalho de bateria exemplar, baixo pujante, uma imersiva omnipresença dos synths e um excelente trabalho de complementação dos dois guitarristas. Donos de um death metal melódico com influências symphonic, é impossível ficar indiferente ao constante debitar de riffs corpulentos mas melódicos e a uma bateria implacável que ora nos brinda com um pedal duplo arrasador, ora leva tudo à frente com blast beats, conferindo sempre grande variabilidade à estrutura das canções. A voz de Sara Leitão é simplesmente avassaladora, também ela dona de uma garra invejável, capaz de ombrear com todas as Alissas White-Gluz deste mundo. Se no álbum se realça a veia mais sinfónica da banda, ao vivo a sonoridade consegue tornar-se mais sólida, agressiva e pujante. Juntamente com os solos e as samples neoclássicas, consegue-se criar uma ambiência soberba de furiosa grandiosidade. A segunda música, e também o single do álbum, “Tree of Life”, conseguiu arrancar manifestações espontâneas do público, com um trabalho de guitarras agradavelmente harmonioso a fazer lembrar a conjugação Ammoth, sem cair na imitação. Porém, o momento alto da prestação do colectivo terá sido com o tema “Watchmen of Gods”, onde vimos a frontwoman a descer ao plano dos mortais e a semear o mosh por entre as fileiras de espectadores, já na sua maioria bem colados ao palco com cabelos ao sabor dos acordes pujantes e à catchyness do refão. Após esta primitiva descarga de energia, seguiu-se a excelente faixa título “When Fire Engulfs the Earth”, um autêntico furacão de grandiosidade, terminando o concerto com os agradecimentos da praxe e uma soberba “Brother’s Fall”, que arrancou headbangs até aos mais tímidos presentes nesta grande noite de metal 100% português que se verificou no Metalpoint. Se dois anos passaram desde a última actuação deste colectivo, não se notou, e certamente voltaram mais fortes do que nunca para deixar a marca no panorama metálico português com um álbum que certamente fará as delícias dos apaixonados pelo género.