"O que está para trás interessa pouco por isso a sensação de que está tudo por fazer aparece regularmente."
Entrevista por: Daniel Sampaio
Entrevista por: Daniel Sampaio
Dois guitarristas, duas abordagens diferentes. Jorge Coelho e Filho da Mãe já são conhecidos dos portugueses há vários anos pelo seu domínio das seis cordas, e cruzaram-se no Amplifest 2015, onde tocaram sets em tudo distintos mas igualmente memoráveis. Procurámos saber mais sobre a sua relação com o seu instrumento de eleição, concluindo que as suas visões são curiosamente semelhantes.
Portuguese Distortion - Lembras-te do teu primeiro contacto com a guitarra?
Jorge Coelho (JC) - Consciente ou com idade para perceber bem o que era, lembro-me perfeitamente: foi em casa de um colega de turma, no liceu, perto de onde vivo hoje, na quinta seca em Matosinhos.
Filho da Mãe (FdM) - Creio que terá sido quando enfiei um pé pelo tampo adentro de uma Segovia do meu pai. Lembro-me do meu pai a colá-la... lembro-me das décadas de recriminação suave.
Tiveste alguma educação formal ou foste aprendendo sozinho?
JC - Tive tão pouca que acho que é mais honesto achar que fui, de facto, aprendendo e não aprendendo.
FdM - Fui aprendendo sozinho. Primeiros acordes aprendi-os com o meu pai o resto com o Eurico A. Cebolo e a sua “Guitarra Mágica”, o resto e mais importante a tocar sozinho e com amigos.
Ouvias muito aqueles clássicos como Carlos Paredes ou Paco de Lucia, ou os teus heróis são outros?
JC - Ouvia e ouço Carlos Paredes mas nunca ouvi especialmente guitarristas. Durante bastantes anos só ouvia guitarristas que tocavam "mal", virtuosismo era um pecado capital e demorei a perceber porque é que era assim. Por isso os heróis (ou quem me fez querer mesmo tocar guitarra) estão entre o desconhecido e o absurdo: o gajo dos Sonics, o Robert Quine, o gajo dos Lyres, o Sterling Morrison e muitos outros.
FdM - Ouvia muito esses dois exemplos. Não lhes chamaria heróis. Eram algo distante, inatingível mas sem pretensão de influência, embora tudo isto acabe por ser influência. Quando vivi a “fase parva” da música, do “este toca melhor que aquele”, (felizmente uma fase curta) talvez o meu herói tenha sido o Steve Harris, baixista de Iron Maiden. Perdoem um rapaz ainda novo, mas acho que foi das coisas que mais ouvi em puto.
Seduz-te mais o som das cordas de nylon ou de aço?
JC - A primeira guitarra que tive tinha cordas de nylon quando o que eu queria era uma guitarra elétrica. E desde aí não voltei a ter nenhuma, usei sempre cordas de aço. Gosto muito do som e acho sempre que um destes dias volto a tentar.
FdM - Seduz-me mais o som das de aço. É mais completo em termos de frequência. Mas também acaba por ser um pouco mais determinista, para mim em relação às sonoridades, pelo menos em relação a guitarra solo. Fica-me melhor o som difícil e mais apagado das de nylon... consigo ser diferente do que sou na guitarra elétrica e puxa-me num sentido diferente.
Ao gravar um álbum, preferes o take direto ou a construção gradual das músicas?
JC - Depende do disco mas gravo com muito pouca edição. É-me impensável corrigir uma nota numa gravação, sempre preferi repetir partes inteiras. Mas também não costumo gravar nada que seja particularmente difícil de executar, que seja nisso o desafio.
FdM - Depende da intenção. Ultimamente tenho sido mais tentado pelo lado do take direto e improviso do que da construção mais cerebral... acho que acaba por ser uma mistura das duas. Gosto de ir com muitas coisas por definir para as gravações, mas há outras que gosto de construir ao pormenor.
Qual é para ti a principal diferença entre tocar em banda e aquilo que fazes a solo?
JC - Acho que já tive ideias mais firmes sobre isso. Talvez a possibilidade de reagir a eventos que nunca poderiam ter sido criados por mim.
FdM - É muito diferente, mas difícil de descrever. Acaba por ser pessoal de facto, isso consegue-se sozinho. Às vezes faz-me muita falta tocar em banda.
Apesar de fazeres música instrumental, os títulos das músicas e dos álbuns são por vezes bastante sugestivos. Há músicas com uma imagem e uma inspiração tão fortes que só poderiam ter “aquele” nome?
JC - Às vezes o nome aparece antes da música (raramente), outras vezes é uma perfilhação, com todas as possibilidades. Há ideias ou sensações que agregam a música e o que depois vem a ser o nome.
FdM - Nem sei o que vem primeiro, mas sim, há nomes que se atravessam e depois já não pode ser de outro modo.
Ainda há objetivos a cumprir dentro do meio musical ou noutras áreas artísticas?
JC - Espero que sim! Não sei se algo quantificável ou definido como um objetivo mas tenho a sensação que a vontade de afirmar, pela música ou seja como for, não se vai esgotar nos próximos tempos. O que está para trás interessa pouco por isso a sensação de que está tudo por fazer aparece regularmente.
FdM - Claro que há! Há um mundo inteiro de coisas e sítios novos e sítios repetidos que desta vez serão muito melhores do que da última vez.
Os projetos por onde passaste denunciam o teu ecletismo. O que tens ouvido ultimamente?
JC - É uma resposta difícil porque muda de semana para semana ou de dia para dia. E depende também do tempo/oportunidades para ouvir música direito. Hoje consegui ouvir dois discos de manhã, um do Matthew Shipp e um do Richard Thompson, por isso, deduzo que sem um fio condutor evidente.
FdM - Muita música do Mali e desertos contíguos. Jazz. Menos rock porque já não encontro tanto daquele que gostava, mas ainda assim, rock sempre. Coisas clássicas, coisas novas, coisas esquisitas... aquilo que aparece.
Portuguese Distortion - Lembras-te do teu primeiro contacto com a guitarra?
Jorge Coelho (JC) - Consciente ou com idade para perceber bem o que era, lembro-me perfeitamente: foi em casa de um colega de turma, no liceu, perto de onde vivo hoje, na quinta seca em Matosinhos.
Filho da Mãe (FdM) - Creio que terá sido quando enfiei um pé pelo tampo adentro de uma Segovia do meu pai. Lembro-me do meu pai a colá-la... lembro-me das décadas de recriminação suave.
Tiveste alguma educação formal ou foste aprendendo sozinho?
JC - Tive tão pouca que acho que é mais honesto achar que fui, de facto, aprendendo e não aprendendo.
FdM - Fui aprendendo sozinho. Primeiros acordes aprendi-os com o meu pai o resto com o Eurico A. Cebolo e a sua “Guitarra Mágica”, o resto e mais importante a tocar sozinho e com amigos.
Ouvias muito aqueles clássicos como Carlos Paredes ou Paco de Lucia, ou os teus heróis são outros?
JC - Ouvia e ouço Carlos Paredes mas nunca ouvi especialmente guitarristas. Durante bastantes anos só ouvia guitarristas que tocavam "mal", virtuosismo era um pecado capital e demorei a perceber porque é que era assim. Por isso os heróis (ou quem me fez querer mesmo tocar guitarra) estão entre o desconhecido e o absurdo: o gajo dos Sonics, o Robert Quine, o gajo dos Lyres, o Sterling Morrison e muitos outros.
FdM - Ouvia muito esses dois exemplos. Não lhes chamaria heróis. Eram algo distante, inatingível mas sem pretensão de influência, embora tudo isto acabe por ser influência. Quando vivi a “fase parva” da música, do “este toca melhor que aquele”, (felizmente uma fase curta) talvez o meu herói tenha sido o Steve Harris, baixista de Iron Maiden. Perdoem um rapaz ainda novo, mas acho que foi das coisas que mais ouvi em puto.
Seduz-te mais o som das cordas de nylon ou de aço?
JC - A primeira guitarra que tive tinha cordas de nylon quando o que eu queria era uma guitarra elétrica. E desde aí não voltei a ter nenhuma, usei sempre cordas de aço. Gosto muito do som e acho sempre que um destes dias volto a tentar.
FdM - Seduz-me mais o som das de aço. É mais completo em termos de frequência. Mas também acaba por ser um pouco mais determinista, para mim em relação às sonoridades, pelo menos em relação a guitarra solo. Fica-me melhor o som difícil e mais apagado das de nylon... consigo ser diferente do que sou na guitarra elétrica e puxa-me num sentido diferente.
Ao gravar um álbum, preferes o take direto ou a construção gradual das músicas?
JC - Depende do disco mas gravo com muito pouca edição. É-me impensável corrigir uma nota numa gravação, sempre preferi repetir partes inteiras. Mas também não costumo gravar nada que seja particularmente difícil de executar, que seja nisso o desafio.
FdM - Depende da intenção. Ultimamente tenho sido mais tentado pelo lado do take direto e improviso do que da construção mais cerebral... acho que acaba por ser uma mistura das duas. Gosto de ir com muitas coisas por definir para as gravações, mas há outras que gosto de construir ao pormenor.
Qual é para ti a principal diferença entre tocar em banda e aquilo que fazes a solo?
JC - Acho que já tive ideias mais firmes sobre isso. Talvez a possibilidade de reagir a eventos que nunca poderiam ter sido criados por mim.
FdM - É muito diferente, mas difícil de descrever. Acaba por ser pessoal de facto, isso consegue-se sozinho. Às vezes faz-me muita falta tocar em banda.
Apesar de fazeres música instrumental, os títulos das músicas e dos álbuns são por vezes bastante sugestivos. Há músicas com uma imagem e uma inspiração tão fortes que só poderiam ter “aquele” nome?
JC - Às vezes o nome aparece antes da música (raramente), outras vezes é uma perfilhação, com todas as possibilidades. Há ideias ou sensações que agregam a música e o que depois vem a ser o nome.
FdM - Nem sei o que vem primeiro, mas sim, há nomes que se atravessam e depois já não pode ser de outro modo.
Ainda há objetivos a cumprir dentro do meio musical ou noutras áreas artísticas?
JC - Espero que sim! Não sei se algo quantificável ou definido como um objetivo mas tenho a sensação que a vontade de afirmar, pela música ou seja como for, não se vai esgotar nos próximos tempos. O que está para trás interessa pouco por isso a sensação de que está tudo por fazer aparece regularmente.
FdM - Claro que há! Há um mundo inteiro de coisas e sítios novos e sítios repetidos que desta vez serão muito melhores do que da última vez.
Os projetos por onde passaste denunciam o teu ecletismo. O que tens ouvido ultimamente?
JC - É uma resposta difícil porque muda de semana para semana ou de dia para dia. E depende também do tempo/oportunidades para ouvir música direito. Hoje consegui ouvir dois discos de manhã, um do Matthew Shipp e um do Richard Thompson, por isso, deduzo que sem um fio condutor evidente.
FdM - Muita música do Mali e desertos contíguos. Jazz. Menos rock porque já não encontro tanto daquele que gostava, mas ainda assim, rock sempre. Coisas clássicas, coisas novas, coisas esquisitas... aquilo que aparece.